COVID-19 e a Volta às Aulas
Departamento Científico de Imunizações – Sociedade Brasileira
de Pediatria
Introdução Em 2020 o mundo foi surpreendido por uma pandemia
causada por um novo Coronavírus, denominado SARS-CoV-2, de alta contagiosidade
e associado a significativas taxas de letalidade. No Brasil, pouco mais de dois
meses após o primeiro caso confirmado no final de fevereiro, o país já registra
mais de 170 mil casos confirmados e mais de doze mil mortes.
Até o momento não
se dispõe de tratamento antiviral efetivo, tampouco vacinas profiláticas, e
medidas não farmacológicas têm sido recomendadas, em muitos países, com o
intuito de diminuir a velocidade de transmissão e sobrecarga nos sistemas de
saúde: higiene das mãos, uso de máscaras, quarentena.
A despeito das crianças estarem sendo mais poupadas das
formas graves da doença (são raros os casos de hospitalização e óbitos em
menores de 10 anos de idade), vários estudos têm demonstrado que elas também
são infectadas e apesar de até o momento não termos acumulado evidências que
demonstrem o real papel das crianças na transmissão da doença, devemos
reconhecer que a suspensão das atividades escolares, implementadas em quase
todos os países do mundo, acabaram limitando a possibilidade de que se
conhecesse com clareza o papel das crianças na cadeia de transmissão da doença.
Sabemos que a doença é transmitida por meio de contato
direto com gotículas respiratórias de uma pessoa infectada (fala, tosse e
espirros) e ao se tocar na face (olhos, nariz e boca) após contato com
superfícies contaminadas.
Entre as medidas de controle, o distanciamento social tem
sido ferramenta crucial na redução da transmissão do vírus na comunidade, com
evidências, em muitos países, da efetividade dessa medida; a suspensão das
aulas é parte desta estratégia restritiva.
Portanto, é nosso entendimento que a volta às aulas deva ser
gradual, de forma cautelosa, incluindo todas as precauções possíveis para
minimizar a disseminação da infecção pelo SARS-CoV-2 nas escolas. O relaxamento
das medidas de distanciamento deve ser avaliado em cada município ou estado, em
função de dados epidemiológicos e recursos de saúde disponíveis para o
atendimento dos casos novos, podendo haver a necessidade de eventual retorno à
instalação de medidas restritivas quando a situação epidemiológica assim
indicar. Este documento tem como principal objetivo destacar os pontos mais
importantes a serem considerados por ocasião do retorno às atividades
escolares, com sugestões para pais, educadores e escolas, públicas e privadas,
para segurança de todos.
Volta às aulas
A volta à escola tem sido motivo de apreensão e dúvidas por parte
de pais e/ou responsáveis. Se por um lado existe a preocupação em relação ao
adoecimento dos filhos e, como consequência, de outros membros da família, por
outro lado, há o prejuízo da aprendizagem e sociabilização. Crianças, mesmo
assintomáticas, podem ser transmissoras da doença. Tossem, espirram,
compartilham brinquedos e alimentos sem maiores cuidados.
De um modo geral, as
crianças não fazem parte do grupo mais afetado pela COVID-19, entretanto,
recentemente o Ministério da Saúde do Brasil publicou um documento que
atualizou os grupos de risco, incluindo as crianças abaixo de cinco anos de
idade com síndrome gripal, especialmente as menores de dois anos, nas quais há maior
taxa de hospitalização, especialmente pelo potencial risco da infecção pelo
vírus influenza nestes casos.
Princípios Fundamentais
– Pais e professores devem procurar manter-se informados
sobre a COVID-19 (modo de transmissão, sintomas da doença, medidas de
prevenção) por meio de fontes confiáveis, evitando as fake news;
– Crianças e profissionais da educação, se doentes, não
devem frequentar a escola;
– A escola deve
oferecer diversos locais para lavagem de mãos, água e sabão, álcool em gel e
higienizar frequentemente os recintos e superfícies;
– A escola deve
propiciar ambientes arejados, com aberturas de janelas. Atividades ao ar livre
devem ser estimuladas;
– Cabe à escola evitar aglomerações, na entrada, saída de
alunos ou intervalos, criando horários alternativos para as turmas;
– Jogos, competições, festas, reuniões, comemorações e
atividades que envolvam coletividade devem ser temporariamente suspensos;
– O ensino à distância, sempre que possível, deve ser
estimulado;
Medidas de distanciamento social
As medidas de distanciamento social devem ser adotadas na
escola, com o objetivo de diminuir o grande número de pessoas no mesmo espaço,
reduzindo, assim, o contágio.
Em um primeiro momento o número de alunos por sala, sempre
que possível, deve ser reduzido, e os alunos podem ser divididos em grupos que
se alternem entre a atividade presencial e à distância, de acordo com as
disciplinas curriculares. O estabelecimento de ensino deve se organizar para
que cada turma tenha o intervalo entre as aulas em horário diferente de outras
turmas, assim como estabelecer horários de entrada e saída escalonados,
evitando aglomerações.
Sempre que possível, é recomendável manter um espaçamento
entre os alunos dentro da sala de aula, de acordo com a realidade de cada
escola, idealmente com espaço mínimo de um metro entre as mesas.
Em relação ao transporte escolar, é necessário avaliar o
número de usuários, para que se preserve a distância recomendável entre as
pessoas também no veículo.
Alunos que tenham contraindicações de frequentar a escola
por serem imunocomprometidos, ou tenham doenças crônicas, devem receber
educação à distância, bem como professores e funcionários da escola que sejam
pertencentes aos grupos de risco devem ser deslocados para funções distantes do
contato com alunos.
Medidas educativas
É importante que cada escola adote políticas de educação
para prevenção de infecções que envolvam alunos, pais, professores e
funcionários. Os pais devem ser orientados a não levarem seus filhos à escola
ao menor indício de quadro infeccioso, seja febre, manifestações respiratórias,
diarreia, entre outras. Deve-se mantê-los afastados enquanto se aguarda a
conclusão do diagnóstico, com o cuidado de não se estigmatizar o indivíduo, o
que posteriormente pode trazer consequências negativas, como bullying entre as
crianças.
Caso a criança ou membros da família apresentarem teste
positivo para o SARS-CoV-2, a escola deve ser comunicada, sendo o seu retorno
condicionado à melhora dos sintomas e não antes de 14 dias, a contar do
primeiro dia do surgimento dos sintomas.
A escola deve ter um espaço reservado, para a situação em
que haja adoecimento de algum aluno, professor ou funcionário. Dependendo do
contexto clínico, pode haver a necessidade de conduzir o estudante para
atendimento médico.
Outras medidas de higiene devem ser postas em prática na escola
com o objetivo de diminuir a infecção entre as pessoas:
– Higienização das mãos frequentemente, especialmente antes
e após as refeições e a ida ao banheiro. Reforçar a técnica adequada, conforme
orientada pelo Ministério da Saúde, com duração mínima de 40 segundos
utilizando água e sabão ou de 20 segundos quando utilizado álcool gel;
– A escola deve manter lavatórios em bom funcionamento,
sinalizados e abastecidos com sabão e papel toalha; – Álcool em gel deve ser
disponibilizado para alunos que possam utilizar com segurança e
responsabilidade. Manter higienizadores de mãos em sala de aula, corredores,
banheiros e na entrada e saída da escola;
– Evitar o uso e reuso de lenços de pano;
– Orientar para o uso de lenços descartáveis ou do antebraço
(cotovelo dobrado) ao tossir ou espirra;
– Evitar tocar olhos, boca e nariz;
– Orientar para que cada estudante traga e utilize sua
própria garrafa de água, utilizando os bebedouros comuns apenas para encher
essas garrafas novamente; proibir estudantes de beber diretamente do bebedouro;
– Uso de máscaras deve ser estimulado. Está contraindicado
em crianças menores de dois anos, pelo risco de sufocação e em indivíduos que
apresentem dificuldade em removê-las, caso necessário. As máscaras devem ser
trocadas a cada duas a quatro horas, ou antes, se estiverem sujas, úmidas ou
rasgadas.
As medidas educativas devem ser adaptadas para as diversas
faixas de idade (pré-escola, ensino fundamental, médio e superior), em
linguagem e comunicação adequadas para cada fase.
Estas medidas devem ser estendidas ao ambiente doméstico da
criança e a escola deve promover atividades educativas com intuito de
reforçá-las, assim como exibir material ilustrativo em quadros de aviso, sala
de aula, corredores etc.
Limpeza e desinfecção da escola.
A escola deve proceder à limpeza de seus ambientes pelo
menos uma vez ao dia e, mais frequentemente, das áreas de maior circulação de
pessoas, assim como dos objetos mais tocados (maçanetas, interruptores,
teclados, etc.).
Está recomendado o uso de solução de hipoclorito de sódio a
0,5% para limpar superfícies e de álcool a 70% para pequenos objetos.
Deve-se manter os ambientes arejados, de acordo com as
condições climáticas, além de recolher o lixo com frequência e limpeza
frequente dos bebedouros.
Considerações finais.
A pandemia causada pela COVID-19 tem sido um aprendizado
para todos, sobre o qual, a cada dia, vivenciamos fatos novos, exigindo
constante atualização dos conhecimentos para um adequado enfrentamento desta
grave situação.
Tem sido causa de estresse e ansiedade em grande parte das
pessoas, e as crianças podem estar reagindo de formas diferentes, com
alterações comportamentais, do sono e da alimentação. É importante que a escola
tenha um espaço para que a criança possa falar sobre seus sentimentos, medos e
dúvidas. Nos casos em que se identifique um quadro mais exacerbado a criança
deve ser encaminhada para um acompanhamento especializado.
Estamos todos enfrentando uma crise de proporções mundiais,
amplificada pela inédita conectividade planetária. Temos nos esforçado no
autocuidado, no cuidado a outras pessoas e na adaptação às novas condições de
vida, exigida pelas circunstâncias.
Mesmo com a adoção de medidas de mitigação durante o retorno
às aulas, impactos emocionais, físicos e cognitivos são esperados no curto e
médio prazo, e ações devem ser adotadas numa necessária parceria entre saúde e
educação.
A escola é um espaço de inclusão, formação e de exercício de
cidadania, e neste momento, deve buscar cumprir seu papel, inclusive de
promotora da saúde, com segurança e responsabilidade.