segunda-feira, 16 de novembro de 2009

Drama familiar vira negócio rentável para clínicas

O crime relacionado ao tráfico de drogas, cada vez mais organizado e atuante, somado a falta de perspectiva de futuro, cabeça influenciável dos jovens, associação ao crime com promessa de dinheiro fácil entre diversos fatores ignorados pelo poder público, tem gerado inúmeros dependentes químicos, prato cheio aos "bandidos" donos de falsas clínicas, que sugam o dinheiro de famílias desesperadas ofrecendo em troca tratamentos medíocres e falsas promessas.
É o tema da reportagem abaixo.
ass. Rodriguim.

"Ministério Público investiga estabelecimentos para dependentes químicos que maltratam pacientes e ganham fortunas dos pais com falsas promessas de "cura"
Andréa Silva e Fernando Zuba
Se para quem tem um dependente químico na família enfrentar a batalha contra o vício é um desafio, para muitas clínicas de tratamento ou comunidades terapêuticas clandestinas que agem em Minas e também em outros Estados o drama dessas famílias tem se transformado, cada vez mais, numa verdadeira "galinha dos ovos de ouro". As denúncias que chegam ao Ministério Público Estadual (MPE) não deixam dúvidas de que o desespero de muitos pais e mães virou sinônimo de negócio rentável para donos de estabelecimentos irregulares, que se escondem atrás de um sistema de fiscalização extremamente frágil e cobram verdadeiras fortunas por um tratamento que, em certos casos, sequer existe.

A reportagem de O TEMPO apurou que há unidades que chegam a cobrar até R$ 33 mil por um tratamento de 180 dias. Em Minas, onde a internação involuntária de pacientes em comunidades terapêuticas é proibida por lei, só nos últimos quatro meses, cinco estabelecimentos foram interditados pela Promotoria Especializada de Saúde. Todos funcionavam em Uberlândia, no Triângulo Mineiro. Enquanto o Ministério Público tenta fechar o cerco por aqui, estabelecimentos de fora, principalmente do interior de São Paulo, encontram um campo fértil para agir. Para quem vive em drama, o mínimo a fazer antes de contratar os serviços de uma clínica particular é procurar se informar junto aos órgãos que normatizam o funcionamento desses estabelecimentos.

Em Uberlândia, as denúncias contra os estabelecimentos interditados neste ano impressionam pela crueldade, conta o promotor Lúcio Flávio de Faria. Pacientes que atravessaram os portões dessas pseudoclínicas levados pela esperança das famílias de que voltariam "curados" teriam sido submetidos às mais terríveis sessões de crueldade.

As investigações do Ministério Público constataram desde casos de cárcere privado e tortura até acusações de violência sexual. Três pessoas, entre proprietários e funcionários dos locais investigados, estão presas. Ainda segundo o promotor, nas cinco clínicas interditadas, todos os pacientes, entre eles menores, estavam internados involuntariamente.

A promotoria coletou relatos de jovens que denunciaram que qualquer desobediência à regra do lugar era motivo para castigos como espancamento com porretes e torturas com choques elétricos. Conforme o promotor Lúcio de Faria, além de infringirem a Resolução nº 101/01, da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), e a Lei Antimanicomial, as clínicas irregulares violam os direitos dos pacientes.

Na capital, a promotoria de Justiça de Defesa da Saúde apura a internação involuntária de um mineiro, de 21 anos, em uma clínica da cidade de Piedade, no interior de São Paulo. Por telefone, o rapaz - que não terá o nome revelado - nos contou o drama que vive desde que foi mandado para o local pelos pais, há dois meses. "Esse lugar interna pessoas que não têm condições de conviver em sociedade, e esse não é o meu caso. Preciso sair daqui se não vou enlouquecer".

O rapaz acusa a mãe de interná-lo à força porque ele é homossexual. "Não faço e nunca fiz mal a ninguém. Beber e fumar maconha não faz de ninguém um criminoso que tem que ser privado do convívio dos amigos e familiares. Minha mãe não aceita minha opção sexual", explicou.
O drama relatado pelo rapaz é impressionante. Ele conta que foi apanhado de surpresa em sua casa, em Belo Horizonte, sem qualquer exame prévio. "Três homens me cercaram e me aplicaram uma injeção. Quando acordei, já estava neste lugar". O jovem diz que foi vítima de maus-tratos e conta que, dos 60 dias de internação, já chegou a ficar 25 na chamada "solitária" como forma de castigo. Com a voz embargada, antes de terminar a ligação, ele revelou que no lugar há muita violência. "Temos que fazer o que eles querem, do contrário, os castigos são aplicados, sem piedade".

A reportagem de O TEMPO também fez contato com a mãe do interno, que saiu de Belo Horizonte e está em São Paulo desde que contratou os serviços da clínica. Ela dá outra versão para a história. "Conheço o meu filho. Ele estava utilizando drogas pesadas e podia causar danos irreversíveis a sua saúde". Segundo ela, todas as medidas foram tomadas dentro da lei. "Jamais faria algo para prejudicar o meu próprio filho".

O promotor Bruno Alexander, que recebeu a denúncia, não quis dar detalhes do caso. Segundo ele, a investigação é sigilosa. "Recebemos dezenas de denúncias sobre o translado de pessoas para clínicas em outro Estado. Fazemos os primeiros levantamentos e depois encaminhamos tudo ao promotor da comarca responsável. Ainda estamos aguardando o resultado da maioria", explicou. A Lei Federal nº 10.216/01 determina que todas as internações involuntárias devem ser comunicadas ao Ministério Público, num prazo de 72 horas, assim como os casos de alta."

Fonte: Jornal o Tempo

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